Arquitecto «a remar contra a maré»
Diz que não tem trabalho porque não gostam dele e pelo seu papel tão crÃÂtico e interventivo. Para José Pulido Valente, quem aprova os projectos que se fazem são as máfias e por isso é que os seus projectos são sempre chumbados. Prova disso é o seu ateliê, espaçoso mas de alguma forma votado ao… Continue reading Arquitecto «a remar contra a maré»
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Diz que não tem trabalho porque não gostam dele e pelo seu papel tão crÃÂtico e interventivo. Para José Pulido Valente, quem aprova os projectos que se fazem são as máfias e por isso é que os seus projectos são sempre chumbados. Prova disso é o seu ateliê, espaçoso mas de alguma forma votado ao abandono, onde maquetes antigas se misturam com um projecto novo. Recentemente, lançou o livro «A remar contra a maré», onde reúne um conjunto de artigos que foi publicando na imprensa ao longo de anos. Foi este o mote para uma conversa onde José Pulido Valente esgrime argumentos e dispara crÃÂticas em várias direcções.
Construir: Tem feito projectos ultimamente?
José Pulido Valente: Uma vez ou outra aparece-me um cliente por uma razão que eu não sei qual é. Não tenho nenhum bispo, nenhum militar, mafioso, maçon, polÃÂtico, partido ou padrinho, de modo que apenas me aparecem trabalhos por acaso.
Acha que os trabalhos só aparecem com «ajudas»?
Evidentemente. Neste paÃÂs só quem for do partido ou da máfia é que faz projectos. Há muita corrupção.
Porque diz isso?
Porque é verdade! Veja o caso do shopping do Bom Sucesso. O Supremo Tribunal Administrativo já disse que a construção é ilegal, mas por causa dos empregados e porque já está construÃÂdo, o juiz estava àespera que o novo PDM entrasse em vigor para legalizar a obra. Isto não faz sentido. Entretanto o promotor vendeu um edifÃÂcio que é ilegal e a câmara continua a dar licenças para ocupação dentro do shopping. Isto é realmente não considerar a lei.
Acha que há corrupção na câmara do Porto?
Claro! Antes do Rui Rio estava cá o PS e já nessa altura se falava na revisão do Plano Director Municipal (PDM), que datava de 1993 – tinha sido feito entre 82 e 87 mas acabou por só ser publicado em 1993. Mas o PS nunca colocou a revisão do PDM em andamento. Ninguém aplicava aquele instrumento, não percebendo como ele poderia ter sido benéfico para a cidade. Eles controlavam tudo. Por exemplo, no plano director de 1993 havia uma alÃÂnea que acabava com a comissão de estética, que era outra coisa que servia para «lixar» os projectos dos arquitectos, substituindo-a pela comissão nacional de defesa do património. No papel esta era constituÃÂda essencialmente por pessoas exteriores àcâmara, mas depois, quando reformavam algum funcionário da autarquia, acabavam por colocá-lo na comissão e portanto tinham o controlo na mesma.
A comissão de estética era uma espécie de censura?
Sim. O meu segundo trabalho aqui no Porto, estávamos em 1964, foi feito para um amigo que é pintor e que queria fazer uma casa para a mãe que tinha vindo de ÃÂfrica, com pouco mais de 300 contos de poupanças. Com 200 e tal contos fizemos uma casa e comprámos um terreno que hoje está numa das melhores zonas do Porto, mas que na altura custou 70 contos. Esse projecto, que era para um loteamento novo, foi chumbado 23 vezes com o carimbo da comissão de estética que dizia «não satisfaz». Depois, amigos meus disseram-me que enquanto tivesse a escada por fora não me aprovam o projecto. Fiz outro trabalho com a escada por dentro, foi aprovado, mas é a única casa que não tem a escada por fora. Entretanto, já tinham entrado dois projectos com escada por fora que foram aprovados.
Voltando atrás, falava da corrupção na câmara do Porto…
O maior descaramento surge recentemente, quando o Nuno Cardoso resolveu com a colaboração dos arquitectos Manuel Fernandes de Sá e Manuela Juncal, assim como com a do engenheiro Alexandre Barros, fazer umas normas provisórias. Na primeira folha deste documento diz que «normas provisórias são para ser aplicadas aquando da suspensão do plano director». Quer isto dizer que para entrar em vigor uma norma provisória é preciso que o PDM seja suspenso. Mas ele não foi suspenso. Pior, é que nessa mesma folha inicial diz que o PDM está em vigor. Este documento foi assinado pelo então ministro dos Negócios Estrangeiros, Jaime Gama, porque o João Soares não estava cá. Isto uma altura em que a câmara era PS, ou seja, mais um arranjinho daquela máfia polÃÂtica.
As normas provisórias são ilegais e já serviram para fazer a Alameda 25 de Abril, o Plano de Pormenor das Antas, o Hotel Altis do João Paciência, e até para aprovar o projecto da Quinta da China. Isto é um bandalhice do caraças. Aprovam tudo por causa do dinheiro, mas quando um desgraçadinho faz um pombal mandam-no deitar abaixo porque não tem licença ou então deita a câmara e depois mandam a conta. À pala das normas provisórias, a câmara anda a dar licenças aos gajos da massa.
Mas a revisão do PDM do Porto foi agora concluÃÂda…
Não houve revisão nenhuma. Houve foi a substituição de um plano por outro. Para fazer a revisão tem de se manter alguma coisa do anterior no novo. Isso é ilegal e por isso é que eu digo que não há plano director nenhum.
A figura de PDM acaba por ser necessária para organizar uma cidade?
Eu acho que devem haver regras. Agora, se é através disto ou daquilo não sei. Mas acho que deve haver um Plano. Há relacionamentos intermunicipais que têm de ser respeitados, mas depois cabe aos habitantes de cada freguesia juntarem-se e decidirem o que é melhor. Não é um gabinete qualquer de Lisboa que vai decidir o que é melhor para determinada zona do Porto. Tem de haver participação pública e actualmente isso não existe, não dão oportunidade às pessoas para isso. Devem existir PDM’s com qualidade, mas depois são completamente deturpados pelas decisões polÃÂticas. Na câmara do Porto usam o plano director como melhor lhes convém. São uns mafiosos e um mafioso é aquele que não respeita a lei e arranja uma lei paralela, de modo que toda a gente tenha uma lei própria.
Disse uma vez que havia muitos atentados ao património. Consegue dar alguns exemplos?
Tudo o que se faz é um atentando ao património, porque não está bem feito. É o caso do Shopping do Bom Sucesso, o edifÃÂcio dos Oceanos, o terem desfeito a Avenida da Boavista com o pretexto de porem lá o metro, o próprio metro, a Avenida dos Aliados, onde os parvos do ÃÂlvaro e do Eduardo deitaram a tradição fora, tiraram tudo o que era decorações antigas em calcário e granito preto, tiraram os canteiros e as floreiras, reduziram a placa central. São uns miseráveis. Eles não consideraram os envolventes e o trânsito. Fizeram um bilhete postal para aquele sÃÂtio. É design de moda. Eles não fazem arquitectura, fazem design de moda. São as Anas Salazar, os Miguel Vieira da arquitectura. Não são arquitectos. E o próprio Eduardo, a propósito de uma obra que ele fez na Avenida da Boavista, disse que os urbanistas impõem a volumetria e que nós só temos que fazer a pele.
Como assim?
Quando um arquitecto pede uma planta àcâmara, fornecem-lhe exactamente o rectângulo onde ele tem de trabalhar e dizem-lhe qual é a altura. Este sistema é igual ao que se usava quando tirei o curso, mas na altura este não era um método muito respeitado. Chamavam-lhe o urbanismo de pourchoir.
Acha que o seu papel crÃÂtico é a causa por se sentir abandonado pelos seus colegas?
Claro. Estou sozinho nisto, mas não poderia exercer a profissão ou estar na vida se não fosse assim, porque sentir-me-ia mal com a minha consciência, comigo mesmo. A minha mulher diz que eu é que fiz um deserto àminha volta, e que afastei os clientes. É verdade. E muitas vezes conscientemente. É uma questão de princÃÂpio.
Como define a sua forma de fazer arquitectura?
Nunca fiz qualquer trabalho para o pato bravo. Faço sempre uma busca de como vou compartimentar o espaço, não sigo as ideias do Corbusier que enfia uma série de pessoas num paralelepÃÂpedo atravessado por uma rua e depois no andar de cima coloca um terraço comum onde se situa uma piscina. O que é importante é que se inventem novas formas de ocupar o espaço. A maneira como o sistema produtivo da construção está feito é a que vai servindo melhor aos empreendedores.